terça-feira, maio 05, 2015

Sedução e Insuficiência Narcísica: "You Give Love a Bad Name"



Seduzir e ser seduzido(a)... Dramatização e ritual do desejo e da paixão sensual e erótica... Promessa e preambulo da paixão, do amor e do encontro apaixonado entre dois corpos. Mas a sedução têm um outro lado... Algumas pessoas parecem usar a sedução de forma bem diferente, uma forma que procura alimentar um vazio interior persistente (por exemplo), mas que em troca serve destruição de bandeja a quem se mostra mais vulnerável ou menos capaz de se proteger desta sedução mandatória (para o sedutor) e predatória (para o seduzido).

A sedução pode ser uma forma através da qual algumas pessoas com características narcísicas procuram sistematicamente regular uma autoestima deficitária, a qual dependerá então das conquistas sexuais (mais no caso dos homens) ou da coleção/disponibilidade de pretendentes (mais no caso das mulheres, mas também dos homens). Muita vezes uma quantidade significativa de tempo e esforço é despendido no sentido de garantir uma fonte segura e disponível de pretendentes, sem que exista um real interesse num envolvimento concreto.

A destrutividade deste tipo de sedução está relacionada nomeadamente com o facto de não se tratar muitas vezes de uma sedução que visa necessáriamente a relação ou o envolvimento, e não só não informa a outra parte de tal como a ilude no sentido oposto. Algumas vezes semi-camuflada e auto-desculpabilizada por meio e por entre atitudes e discurso comuns, respetivamente, esta atitude tende a vitimizar em particular pessoas com baixa autoestima, carências afetivas e tendência à idealização. São as psicologias mais depressivas e também as narcísicas que tendencialmente são os "alvos-fáceis" e acabam usadas/abusadas também por outras psicologias com insuficiências narcisicas. A dor da rejeição une-se ao sentimento de se ter sido usada(o) e a combinação pode ser demasiado dura, podendo mesmo criar e agravar problemas ligados à representação do outro sexo e das relações com o outro sexo, como por exemplo dificuldades de confiança, desconfiança persistente e/ou desejos (conscientes ou inconscientes) de vingança. Os adolescentes (rapazes e raparigas) são por vezes os mais afetados e arrastados para dentro destas dinâmicas relacionais, quer por vulnerabilidade às mesmas quer pelo desconhecimento próprio da idade. A própria fase da adolescência implica frequentemente um estado normal de abaixamento de autoestima que pode ser compensado através da descoberta do poder e efeitos da sedução. A normalização do narcisismo e a descoberta do poder e consequências do ato de seduzir trazem por sua vez a maturação e um sentido de responsabilidade perante o ato em si, o que tende a acontecer menos quando a autoestima não consegue normalizar ao longo da vida.

Um exemplo de uma psicologia histérico-narcísica é por exemplo a rapariga universitária atraente, tímida e simpática, com um sorriso magnético, o qual dirige todos os dias durante as aulas a um certo rapaz. Desenvolve-se uma amizade entre ambos e o rapaz apaixona-se, mesmo sabendo que há um namorado, embora ela dê a entender que a relação vai mal. Sempre que o rapaz tenta ser mais próximo ela parece tornar-se mais fria e alheia, ou afastar-se. Algumas vezes o rapaz desanima e desiste, mas sempre que o faz a rapariga parece ficar mais próxima dele, atira-lhe um "piropo" ou faz-lhe uma carícia que o anima, dança discreta mas provocativamente ao pé dele, ou transparece de alguma forma no discurso uma vaga possibilidade de envolvimento futuro. Este registo mantém-se por cerca de um ano e o rapaz sofre muito durante este período, chegando mesmo a perder algum cabelo devido ao stress. Certo dia o rapaz ganha coragem e acaba por ser rejeitado pela rapariga. Um ano depois o rapaz vem a saber que durante as aulas a mesma rapariga dirigia intencionalmente os respetivos sorrisos a vários outros rapazes, que mantinham com ela o mesmo tipo de relação que ele vivia com ela.

Algumas vezes a sedução surge de forma mais direta, outras vezes surge de forma mais camuflada (sob forma de timidez e “inocência”, por exemplo). A baixa autoestima é temporariamente negada pelas conquistas, pelos pretendentes e pelo sentimento de se ser desejado(a) (por alguém valorizado, ou por alguém que é valorizado pelos demais – a “pessoa-troféu”), ou sentimento de se ser uma pessoa bonita e atraente, o que curto-circuita temporariamente a angústia do vazio, por exemplo, ou confere segurança numa auto-imagem mais frágil dessa pessoa enquanto homem ou mulher (outros ganhos podem também ser considerados). Ainda que possa não haver um interesse num qualquer envolvimento com um determinado pretendente, estes são muitas vezes mantidos por perto e à distância certa, a de satisfazerem unilateralmente o narcisismo pessoal tanto tempo quanto possível, sob pena de queda numa depressão narcísica, por exemplo.

Nas psicologias narcísicas o sucesso relativo das estratégias defensivas, combinado com circunstâncias de vida também relativamente favoráveis tendem a camuflar o problema de fundo, que se torna então mais evidente e inescapável mais tarde na vida. Outras pessoas deparam-se com circunstâncias de vida menos favoráveis mais cedo nas suas vidas, o que coloca em evidência aquilo que de outra forma tende a apenas ser alvo da própria atenção muitos anos depois, muitas vezes resultando num aproveitamento superficial da vida até então. É ainda de referir que podem também acontecer momentos de falência narcísica ao longo da vida, pelos mais diversos motivos. A própria adolescência é particularmente marcada por um período de fragilidade narcísica, tornado este tema muito mais complexo. Mais ainda se considerarmos as próprias dinâmicas relacionais internas às relações narcísicas que se estabelecem enquanto relações amorosas.

Fica um excerto do clássico "You Give Love a Bad Name" dos Bon Jovi:

"An angel's smile is what you sell"
"You promise me heaven then put me through hell"
"Chains of love, got a hold on me"
"When passion's a prison you can't break free"

"Shot through the heart and you're to blame"
"You give love a bad name"
"I play my part and you play your game"
"You give love a bad name"

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