quinta-feira, dezembro 19, 2013

EMDR em Grávidas parte II


A gravidez é um período privilegiado de desenvolvimento psicológico, de integração maturativa. Contudo nem todas as mulheres vivem ou sentem as suas gravidezes (sobretudo a primeira) como tal.

Os desafios psicológicos, ou etapas maturativas da gravidez compreendem a estruturação de uma identidade materna e formação de um vínculo pré-natal com o feto. Quando o trabalho psicológico da gravidez permite uma boa adaptação a estas tarefas, a gravidez é habitualmente sentida enquanto uma vivência verdadeiramente maturativa. Por sua vez, estes ganhos de maturação estão relacionados com uma relação mãe-bebé relativamente tranquila e saudável no pós-parto.



Como preditor, digamos, da possibilidade maturativa que a etapa da gravidez pode ter para uma mulher, podemos considerar o grau particular de integração de personalidade dessa mulher – por exemplo, a capacidade de uma mulher se referir a experiências de infância com os principais cuidadores de uma forma organizada e livre de contradição, conjuntamente com a capacidade de nomear livremente um espectro multidimensional de pensamentos e emoções sobre essas relações. Por outras palavras, até que ponto uma mulher se encontra resolvida, estável e satisfeita consigo mesma enquanto indivíduo, com os seus relacionamentos, com o seu passado (nomeadamente a sua infância) – conseguindo uma compreensão ampla, estável e precisa das individualidades e dos motivos das atitudes e decisões daqueles que foram os seus cuidadores durante a infância – e funciona de acordo com uma moralidade madura e consistente.

As terapias focadas e de curta duração podem aproveitar esta etapa evolutiva na vida de uma mulher e resolver questões emergentes. Com a aplicação da terapia EMDR estes bons resultados podem surgir rapidamente, uma vez que determinadas sensações e vivências psicológicas desconfortáveis podem ser trabalhadas no sentido de serem dessensibilizadas e reprocessadas \ elaboradas de maneira a não conduzirem a, por exemplo, pensamentos persistentes de dúvida que possam aumentar a ansiedade para níveis que coloquem em causa o estabelecimento do vínculo mãe \ bebé.

No outro pólo, uma vivência subjectiva habitual de ansiedade, confusão e conflito em relação a si mesma e ás suas relações irá tendencialmente ofuscar a vivência da gravidez enquanto fase de desenvolvimento e interditar a possibilidade de maturação psicológica.

O próprio ciclo menstrual indicia este grau de integração da personalidade, ou de preparação psicológica para a gravidez (possibilidade de vivenciar a gravidez enquanto fase maturativa e possibilidade efectiva de maturação). Tal deve-se á presença da progesterona durante este período, bem como durante a gravidez e lactação. Psicofisiologicamente a progesterona está associada a uma reemergência consciente de temáticas e problemáticas psicológicas relacionadas com o passado de uma mulher, nomeadamente o passado referente aos primeiros 2 ou 3 anos de vida - são reactivados traços mnésicos profundamente interiorizados durante este período da infância, no qual se desenvolvem os comportamentos maternos “protótipos” de cuidar e dar afecto ao bebé mediante identificação (introjetiva) com a própria mãe. Este passado não só tende a ser inconsciente como também é não verbal, anterior à aquisição da linguagem e da memória, mas não anterior à “memória emocional” (apenas podemos lembrá-lo emocionalmente).

O processamento destas memórias emocionais pré-verbais de forma a que contribuam para o crescimento pessoal da mulher no período de gravidez pode ser facilitado pelas terapias que privilegiam ou integram métodos, princípios ou abordagens que focam estas vivências pré-verbais, e também vivências emocionais traumáticas, muitas vezes de difícil acesso, difíceis de colocar em palavras e mesmo de trabalhar a um nível puramente verbal.

Como é reconhecido actualmente, a terapia EMDR obtém bons resultados nas perturbações de stress pós- traumático e mais recentemente estudos validam a eficácia nas perturbações de ansiedade em geral, em especial no Transtorno Obsessivo Compulsivo que até agora era patologia de progressão lenta e incerta com outras formas de terapia.

Podemos dizer em suma, que a gravidez é uma altura fértil para mudanças terapêuticas e criar novas bases para que as próximas gerações nasçam emocionalmente saudáveis.


Existem ainda alguns outros aspectos interessantes e importantes sobre gravidez, maturação, potencialidade psicoterapêutica durante este período e psicopatologia (incluindo psicopatologia da relação mãe-bebé no pós parto), mas que para já deixaremos para uma próxima oportunidade.

Escrito por:
Diogo Gonçalves, Psicólogo Clínico na Psicronos.
Pedro Santos, Psicólogo Clínico e Terapeuta EMDR na Psicronos

Sem comentários: