terça-feira, dezembro 26, 2006

"Silentiu"


Ao pensar no valor do silêncio, no lugar que o silêncio ocupa na relação terapêutica, o que surge de imediato à memória?

Se para uns, tal é sentido como um desconforto, para outros, certamente que não o é.

Será que o silêncio ocupa o lugar da palavra ou sobrepõem-se ao lugar do próprio silêncio?

Parece-nos que existem muitos "silêncios". O silêncio daquele que pensa falar mas não fala por opção, daquele que não consegue falar e daquele que simplesmente não quer falar. Também poderá haver o silêncio daquele que não lembra "a palavra". E ainda, aquele silêncio que surge nas reticências das palavras ditas.

Actualmente, no contexto e ritmo das ditas sociedades ocidentais, "civilizadas", urbanas, etc e tais, onde se encontra o silêncio? Que significado se atribui?

Deixemos as palavras de quem escreve sobre o silêncio:

"...o silêncio deixa de afirmar, escuta, demora-se npos objectos insignificantes, não em arcas e armários, em bibelots, cofrezinhos, não somos a gente a ouvi-lo, é ele a ouvir-nos a nós, esconde-se na mão que se fecha, numa dobra d etecido, na gaveta onde nada cabe salvo alfinetes, botões, pensamos ' vou tirar o silêncio dali'...

António Lobo Antunes
"Ontem não te vi em Babilónia"

3 comentários:

Anónimo disse...

O que mais me fez impressão num pequeno filme que vi sobre Rogers, era vê-lo a "reforçar" com "hum-hum" sucessivos, a cliente que se sentava à sua frente, cliente essa imbuída num nível incrível de desesperança. Também se dá em teoria que a "atenção flutuante" é um elemento essencial nas psicoterapias psicodinâmicas, permitindo interpretar até os silêncios. Mas só quando temos realmente alguém à nossa frente, que só fala por silêncios, é que compreendemos o quanto este pode esconder...
Há uns tempos saí, com uma pessoa que me é muito especial, de uma sala de cinema (depois de assistir à última sessão daquele dia). Pelo caminho, essa pessoa não proferiu qualquer som. Senti-me mal. Só eu falava e não obtinha qualquer tipo de feedback. Semanas mais tarde, essa pessoa acusou-me de não saber "apreciar o silêncio"... Para mim o silêncio foi, durante 4 anos, sinónimo de incompreensão, dor e angústia, daí não ter compreendido a sua posição. Mas agora já percebo a sua posição. Já percebo que apesar de por vezes evitarmos o silêncio, este pode ser a forma que temos nos exprimirmos, de percebermos que até connosco, algo pode estar mal. Não faz mal não falar… E como diria o escritor, afinal de contas, “todas as palavras são como pedras”…

Anónimo disse...

Em contexto terapêutico ou não, penso que se aplica um dos axiomas da comunicação: é impossível não comunicar. Neste sentido, o silêncio não substitui nem esconde a palavra. O silêncio é a palavra, por vezes carregando tanto ou mais sentido do que qualquer verbalização.
Em clínica o silêncio de qualquer das partes é polissémico, podendo ser terapêutico ou não. Como, de resto, tudo na clínica, depende da forma do momento em que se usa.

Cleopatra disse...

Por vezes o silêncio é terrivelmente barulhento.
E diz coisas que nenhuma palavra conseguiria dizer.
Quando amuo, faço um silêncio profundo doído e que faz doer.
E tento ferir com o meu silêncio....
O meu silêncio é como uma chuva de pedras....
Forma estranha a minha de usar o silêncio.
É que eu, não sou pessoa de silêncios.
Fazer silêncio para mim é uma violência... pronto fico-me por aqui hoje.