domingo, julho 09, 2006

Foi dito...

"O ideal está em ti; o obstáculo para a sua realização também está dentro de ti."

Thomas Carlyle
(1795-1881)

4 comentários:

Ana Almeida disse...

Olá, Cristina. Seja bem-vinda!
Não conheço o autor, Thomas Carlyle. Foi escritor? Filosofo? A frase que escolheu é muito interessante remete-nos claramente para as dinâmicas do mundo interior. O ideal está dentro de nós assim como os obstáculos para a sua realização. Tendo sido um pensamento anterior a Freud é bastante Freudiano. Acho que esta sua escolha poderia gerar um debate sobre aquilo que em nós nos impede de atingir os nossos objectivos (ideais). Na minha opinião, o Ideal é por vezes, ele próprio um dos obstáculos a essa mesma concretização.

Ana Lopes disse...

olá cristina. olá dra. ana.
é com grande interesse e curiosidade que leio as palavras de thomas carlyle. esta tem sido uma questão que me tem ocupado bastante tempo e espaço mental. para me ajudar a pensar a "prisão" que o indivíduo constitui para si mesmo, tenho-me socorrido de jean bégoin e da suas linhas sobre o sofrimento psíquico e o "désespére de ne pas pouvoir se déveloper".
apesar de considerar a sua contribuição extremamente rica e interessante sinto uma incapacidade de pensar a "chave" clínica para essa "cela" interna.
creio que, a problemática do obstáculo se encontra no indivíduo mesmo na ausência do ideal a alcançar.
muitas vezes se observa, na clínica, este nó que se opõe ao desenvolvimento, à execução, a uma aproximação cada vez maior do sujeito ao seu eu maior (o eu verdadeiro, construído e enriquecido, pela acção e pensamento - podendo ele pensar e agir, na ausência desse impedimento interno a que carlyle chama de obstáculo).
aqui ocorre-me que, ao contrário do que disse mais acima, o ideal está sempre presente. penso agora na importância de pensar o ideal do eu e o eu ideal...
creio que a minha dúvida central é
se o impedimento interno à realização de algo, que aproxima o indivíduo de um eu maior e cada vez mais verdadeiro, provoca, muitas vezes, um profundo sofrimento psíquico, porque é que o indivíduo não consegue a sua transformação (desapertando o nó interno e libertando a energia construtiva que, num funcionamento fechado e circular de inacção, se transforma em energia destrutiva)

gostava muito de ler a vossa posição sobre esta questão

am grande abraço, ana

Ana Almeida disse...

Olá Ana!
Concordo consigo, o Jean Bégoin é um autor muito interessante e felizmente tem estado entre nós algumas vezes a convite da Associação de Psicoterapia Psicanalítica na Infância e nos Jovens (APPIJ - appij@hotmail.com) e da SPP. O último livro dele editado entre nós é de facto muito interessante.

A questão sobre se o obstáculo para a realização do ideal se encontra no próprio ideal parece-me pertinente, mas parece-me também que não esgota a complexidade do problema. Por vezes, em certas situações clínicas (ou não) o ideal é o verdadeiro obstáculo porque foi construído com um desfasamento tão grande da realidade que se torna por definição inalcançável. Mas outras vezes, parece-me que o problema não reside aí. A relação entre o Eu Ideal e o Ideal do Eu é bastante complexa também. Como com certeza saberá foram “instâncias” referidas por Freud e que se aproximavam muito da esfera do superego, constituindo uma espécie de triângulo que “regulava” a auto-estima. O Eu Ideal e o Ideal do Eu são, de uma forma sucinta e grosseira, respectivamente aquilo que eu gostaria de ser num mundo ideal e os valores ideais que adopto para o meu sistema moral. Parece-me que o obstáculo também poderá advir de qualquer uma destas instâncias ou do efeito potenciador gerado por contribuições de cada uma delas.

David Zimerman num dos seus livros (não me lembro de qual, mas se estiver interessada, depois procuro e dou-lhe a referência) fala de um conceito desenvolvido por ele próprio a que chamou “anti-ego”. Gosto particularmente deste conceito porque representa tudo aquilo que uma parte da nossa mente faz para “impedir” que o ego leve os seus projectos a bom porto. Parece-me que este conceito poderia ajudar a entender um pouco este fenómeno, i. e., querermos algo e não sermos capazes de atingir esse algo. O que acha deste conceito?
Obrigado pelo seu comentário e pelas suas reflexões.

Cristina Fidalgo Verde disse...

Olá Anatito, olá Dra. Ana:

Thomas Carlyle foi filósofo e matemático e na minha perspectiva apresentava ideias inovadoras para a época, sendo que o seu pensamento continua a servir a reflexão. Relativamente às ideias aqui apresentadas considero-as muito interessantes e pertinentes e creio que se aproximam e até complementam o que eu penso sobre o assunto. Parece-me que a reflexão sobre este assunto passa por um lado (e como aqui já foi abordado) pela ambivalência do ideal, tanto no que diz respeito ao seu confronto com a realidade, como pela questão de que se for realizado deixa de ser ideal e deixa de cumprir as funções para as quais foi criado (provavelmente de carácter narcísico). Por outro lado, e em termos de dinâmica interna, penso que o conceito referido pela Dra. Ana (anti-ego) é de extrema importância para o entendimento desta temática e creio que poderá ser complementado com as concepções de Rosenberg (1995) relativas à existência de um masoquismo guardião da vida (em contraponto com um masoquismo mortífero). De certa forma estas concepções surgiram em grande parte da reflexão sobre alguns trabalhos de Freud tais como a teoria da dinâmica pulsional, o princípio de prazer e o princípio de realidade e a economia do masoquismo. Na minha perspectiva, este masoquismo guardião da vida tanto procura o equilíbrio pulsional como o equilíbrio narcísico. A Anatito fazia referência ao sofrimento psíquico e ao sentimento de encarceramento interno pela dificuldade de realização do ideal, tendo em conta o que foi dito anteriormente, creio que poderá advir de uma falha no entrelaçamento pulsional que se traduz no impasse daquilo a que chama energia construtiva e destrutiva e que quando se tenta “desapertar o nó” o que tansborda muitas vezes é a pulsão agressiva e destrutiva pela intolerância à frustração resultante do confronto entre o ideal e a realidade. O que pensa sobre isto?